“É uma dor muito grande, como uma ferida aberta…”.
Para alguns de nós, que estão ou se sentem sozinhos, a existência pode ser dolorosa. Não passa de uma existência carnal, por vezes sem alma ou individualidade (uma vez que esta se constrói também com aquilo que os outros nos devolvem sobre nós mesmos, através do olhar, das palavras, ou da simples presença).
Quando pensamos em Solidão, associamo-la quase que automaticamente a algo de negativo, penoso, causador de sofrimento emocional, físico e social. Todos os dias somos confrontados com notícias de pessoas que vivem na solidão, completamente desamparados, numa existência que parece limitar-se à tentativa de manter em equilíbrio a satisfação das suas necessidades físicas; ficamos por isso confusos quando ouvimos relatos de outras pessoas que buscam na solidão um refúgio (não uma fuga) e não a encaram como algo negativo, podendo até viver bastante felizes e realizados.
Estar Só não é por si só algo mau ou doloroso… pode ser até bastante terapêutico, quando é um desejo nosso, algo que parte da nossa vontade consciente e ponderada… o que é mau e doloroso, é ser deixado sozinho, na solidão, contra a nossa vontade… ser ou sentir-se abandonado! Esta forma de solidão dói… ser abandonado por alguém que valorizamos afectivamente, alguém de quem gostamos… “não há nada nem ninguém que preencha este vazio”… é nestes contextos que a solidão se transforma numa espécie de poço sem fundo, um vazio imenso, do qual só se conhece o início mas não se adivinha o fim! Nestas situações algumas pessoas limitam-se a deixar passar o tempo (não somos nós que deixamos passar o tempo… o tempo é que vai passando de qualquer forma), perdendo assim a oportunidade de viver o tempo (isto sim é uma opção nossa).
“Estou apenas à espera que o tempo passe”… é uma atitude desesperada… e no desespero a probabilidade de se cometerem erros aumenta exponencialmente… “faço qualquer coisa para preencher este vazio…” Qualquer coisa? Quando aceitamos qualquer coisa, podemos ter de nos contentar com uma coisa qualquer!
Perante o desespero da solidão e do vazio emocional (será um vazio… ou apenas algo que está preenchido somente com coisas que fazem doer?), há pessoas que se agarram logo a alguém. Mas agarram-se tanto, tanto, que se perdem de si mesmos… fazem tudo para não voltar a ficar na solidão… há que preencher o vazio com coisas teoricamente boas… de tal forma que perdem a identidade e já não sabem quem são. Então volta a sensação de vazio.
Outras pessoas, quando se sentem na solidão, ocupam de tal forma o tempo… que quando se dão conta o tempo já passou… e volta o vazio emocional.
A solidão por si só não é boa nem má… o que faz com ela é que pode ser bom ou mau para si. Por exemplo, existem pessoas que para não ficarem Sós, vivem permanentemente na angústia de agradar aos outros… “não sou capaz de dizer não!” Este é um falso preenchimento da solidão, uma vez que estarão rodeados de pessoas que em teoria os acompanharão apenas enquanto disserem “Sim!”. “Se é o que esperam de mim, é o que farei…”, “nunca mudei a minha forma de ser, porque tenho medo do que os outros vão pensar”… o problema não está no que os outros poderão pensar, mas sim no que nós pensamos que os outros irão fazer se fizermos algo que não lhes agrade… o problema somos nós!
Sentir-se Só, ou na Solidão (são coisas diferentes), não depende da quantidade de pessoas que nos rodeiam… os vazios emocionais não dependem do que nos rodeia, dependem dos vazios que estão dentro de nós, que por vezes não deixam entrar nada nem ninguém… como um vidro opaco, que não deixa passar aa luz… como se estivéssemos rodeados dum escudo protector… outra vez o medo! O Medo de voltar a sentir-se vazio.
A Solidão é por isso como uma equação, cujas variáveis são as nossas expectativas acerca dos outros e aquilo que a realidade nos diz. Se as nossas expectativas correspondem à realidade, raramente nos sentimos na solidão… mas se esperamos dos outros mais do que eles conseguem/querem dar-nos, iremos sentir-nos sempre sós e desamparados. Por isso a culpa das nossas “dores” e dos nossos “vazios” por vezes não é da solidão, mas da frustração que sentimos quando não temos dos outros aquilo que desejávamos.
É por isso que aceitar quem somos, como somos, sem querer agradar aos outros, abre um vasto campo de possibilidades, onde nos poderemos transformar no que podemos ser… talvez assim possamos rodear-nos das pessoas certas para nós, aquelas que também nos aceitam como somos e que muito provavelmente não nos deixarão sentir o vazio emocional da Solidão, mesmo quando estamos Sós.
Autor:
Rolando Andrade, Psicólogo Clínico (CP O.P.P 4365).